Salve. Há uns anos atrás eu, JH, cunhei o termo (que obviamente não pegou, já que não sou influencer de nada) “efeito Jaden”, que é quando um artista é amado por muitas pessoas, mas raramente alguém realmente gosta de sua música. Isso se dá em parte pela enorme presença do rapper falando algumas coisas falsamente profundas que jovens amam, ou por suas ideias totalmente estúpidas que no fundo gritam o privilégio de nascer milionário e famoso, mas o outro lado da moeda no fim é: a música de Jaden nunca foi realmente muito boa. E não foi dessa vez que isso mudou.
Para quem disse anos atrás que “fazia música porque nada que ele ouve por ai o impressiona”, Jaden sempre mordeu demais seus contemporâneos, indo de Kanye a Travis, de Gambino a Tyler com facilidade. Esse trabalho pelo menos representa uma grande mudança nessa área, não por ser mais criativo, mas por sair um pouco dessas sonoridades óbvias e procurar influências mais fora do rap. O problema é que ao mesmo tempo que faz isso o trabalho continua totalmente vazio de qualquer personalidade marcante, sendo tão sem sal que não chega a ser ruim.
Tirando isso do caminho para não tomar espaço no texto: a escrita do disco inteiro é basicamente uma versão de 16 anos do Frank Ocean, com muitas semelhanças na forma de falar das relações e da visão de quem ama, mas longe do mesmo nível de caneta e uma maturidade inexistente. Isso faz certo sentido pelo álbum representar o artista antes da história de “SYRE”, mas a escrita realmente soa como se viesse de um adolescente bobo, e não por um artista com anos de experiência tentando capturar esta ótica. Pelo menos, nos livramos da mania de grandeza que tanto apareceu em “SYRE” e “ERYS”, onde o artista realmente acreditava ser uma espécie de gênio – não tente agir como Kanye se você não tem o talento de Kanye.
O início do trabalho já mostra isso logo de cara. As duas primeiras tracks, “Circa 2015” e “Falling For You” são bem desinteressantes e mostram o artista sendo um cara apaixonado e tóxico. Se a primeira peca pela voz do artista, que não é exatamente agradável, a segunda é um lullaby clássico de trilha sonora de filme romântico, onde conta com a participação de Justin Bieber, que até encaixa na track mas não agrega muito. Se na segunda a dupla canta “if you don’t call me I’ll jump off the roof” (MENOS BRO), na primeira essa toxicidade aparece de forma um pouco mais forte:
Girl you got me stressed out as fuck
I ain’t been honest enough
You’re the only thing that I want
I’m not giving up
Isso não é dizer que o trabalho não tem bons momentos e boas sonoridades, por que eles aparecem com boa frequência na primeira metade da mixtape e um pouco menos na segunda. “Rainbow Bap” é a melhor track do disco, com um riff de guitarra bem característico de algo que John Mayer faria (e o mesmo vale para o refrão), bons versos e um flow bem sólido que oscila um pouco no fim mas entrega uma bela faixa. “Everything” é uma produção bem legal sendo um pop-rap mais tranquilo e bem performado, mas a faixa perde valor pela dolorosa e chata repetição do refrão, em que o rapper literalmente canta “you’re my everything” 40 vezes ao longo de 2:49. Outro destaque vai para “Photograph”, que embora pareça demais com um sad cut de One Direction ou Justin Bieber, tem a melhor escrita do disco e uma performance vocal aceitável. Willow definitivamente elevaria o nível da canção.
“In The Hills” e “Bad Connection” formam um promissor, porém instável momento. A primeira é um bedroom pop em que Jaden inteligentemente abusa do reverb para salvar o seu vocal e entrega em sua primeira metade uma canção bem agradável de se ouvir, mas na segunda se perde totalmente numa mudança de cara que traz um verso desnecessário e fraco. O que salva é a suave transição para a próxima, que é como se fosse uma continuação da anterior em uma versão um pouco mais rap, mas a partir da metade a track mais uma vez muda e começa a copiar na cara dura a estética de Travis Scott (como tanto fez em “ERYS”), estragando o momentum criado.
O grande problema do álbumé que outros bons (ou razoáveis) momentos do disco vem de canções absurdamente derivativas, o que se dá até nos pontos baixos. “Cabin Fever”, o maior single do álbum e uma canção pop agradável se parece muito com algo que saiu de “Circles”, de Post Malone, com uma produção que também lembra muito One Direction; “Deep End” (que nem é tão boa) tem produção, refrão e flows que lembram muito algo que The Weeknd fazia na era Starboy; “Young In Love”, embora obviamente com uma escrita que não bate nem por temática nem por qualidade, lembra Kendrick em sua fase pré GKMC. O álbum ainda é fechado com a fraca “Boys And Girls”, um hino adolescente que provavelmente foi inspirado em um High School Musical ou semelhante.
Há de se destacar que, embora as referências soem bem distintas, graças à produção, o álbum é o projeto mais coeso que Jaden já apresentou. O problema é que isso se dá também por uma insistência em tentar, ora em músicas inteiras, ora parcialmente, seguir uma estética singer-songwriter, quando, bem… ele não é bom singer, nem bom songwriter. A maioria dessas canções seriam muito melhores se contassem com a ajuda de sua irmã, muito mais talentosa em ambas as frentes e uma ausência sentida nesse disco, já que ambos colaboram tanto.
Ao mesmo tempo que a produção mantém o projeto conectado, com exceção de raras canções (principalmente “Drops Of Sun”, que é uma bela balada entregue pela Trippy Summer Band), ela soa barata e sem vida. SYRE, por mais falho e desconexo que fosse, tentava coisas ambiciosas e possuía algumas batidas luxuosas (claramente inspirada em The Life Of Pablo); desde então, é difícil entender como alguém com tanto dinheiro, nome e passe livre na indústria para trabalhar com os melhores produtores que o mundo pode oferecer faz escolhas tão decepcionantes como na maior parte de seus últimos trabalhos.
Mais uma vez, o artista vai se sustentar em cima de músicas básicas e uma fanbase jovem para fazer bons números, mas continua muito abaixo do nível que ele ou seu público dizem que ele tem. Ao menos aqui temos uma evolução com relação aos últimos trabalhos, rendendo até boas audições a ouvidos menos atentos, mas isso se dá mais por manter o mínimo de coesão do que por qualquer outra coisa. O tempo está passando e com oito anos desde o primeiro dos agora seis lançamentos de Jaden, ainda não há nada realmente interessante ou muito menos inovador para sustentar o status do jovem Smith.