Salve galera, como estão? Dias difíceis esses os últimos né? Se possível cuide de sua saúde mental e dos seus, soque um fascista e vamos à luta! Go aqui hoje para trazer a review do EP “Dolores Dala, o Guardião do Alívio” do Rico Dalasam. Um projeto bem curto, com apenas 5 faixas, mas de muita intensidade e sentimento. Então bora fazer uma faixa a faixa do EP que temos muito o que falar sobre.
DDGA começa com sua faixa título, uma intro bem interessante e pessoal de Rico. Suas falas sobre saudade e alívio mostram um tato bem íntimo do MC no que diz respeito a relacionamentos que vão além da superficialidade do tema, algo que se faz presente no projeto inteiro. A faixa percorre o tempo todo em cima de um beat que começa de maneira bem tranquila, aumentando seu ritmo quando as reflexões do artista mudam da saudade para as recordações dos bons momentos que o relacionamento deixou. Essa pequena virada, conversando com tudo que o MC se propõem a dizer nessa introdução, é a chave para tornar essa faixa tão forte.
A track que segue chama-se “Mudou Como?”, conta com a participação de Mahal Pita e Chibatinha (guitarrista do ÀTTØØXXÁ). O que mais me chamou atenção foi o uso de wordplay no refrão cela/sela:
Já tentei mil jeitos de cerrar a grade da cela
Cela coração, cela
Me zera, me encerra e acaba com isso, miséria
Já tentei mil jeitos de cerrar a grade da cela
Cela coração, cela
Me zera, me encerra e acaba com isso, miséria
Porém, a faixa não se resume apenas a isso. Rico Dalasam quando anunciou o projeto em suas redes sociais falou sobre a dualidade que o EP possui disposta entre o alivio e a dor. Se na primeira faixa tivemos como fala o alivio, nessa o tema foi dor, além do refrão que já destacado, quero fazer mais duas menções honrosas para os seguintes versos:
Nunca entendi
Essas conversa’ trancado dentro do carro
Nem tudo é sexo violento
Enquanto mais violento for nosso bairro
Eu chorei
Você com fone de ouvido, eu gritei
Você com fone de ouvido, eu morri
Você com fone de ouvido vem dizer que mudou
Mudou? Eu duvido!
Mudou? Mudou como?
Devo tá com Síndrome de Estocolmo
Amo pra caralho, amo!
Mas desse jeito você me põe no manicômio
A próxima faixa se chama “Braile”, conta com a participação de Dinho e foi lançada em 2019. No inicio da review comentei sobre o EP sair da superficialidade do tema “relacionamentos”, e é nessa faixa onde sentimos isso de maneira mais incisiva. Rico mostra como questões históricas de um Brasil colonialista tem influência direta na sua vida pessoal, principalmente quando o tema é relacionamento com homens brancos. A faixa possui uma “pausa” para a entrada de um interlúdio que exemplifica muito bem essa questão:
Caro menino branco, esse nosso encontro pede a lucidez
De saber o lugar que me encontro, e você, por sua vez
Se é pra andar ao meu lado
Saiba que alguém foi senhor, alguém foi escravo
E, entre nós, esse “espaço” pede alguns passos
Além da profundidade que a música tem, gostaria de deixar outro ponto muito positivo: um pandeiro muito, mas muito bem encaixado nesse beat e, principalmente, quando o MC rima em cima a seguinte sequência com um timing perfeito, tornando o som uma experiência ainda mais prazerosa:
Clack clack clo clay plack, eu penso
Clay clay clo tcho plack, eu paro
Clay clay clo, eu paro e avanço
Clay clay clo, eu paro, eu colo
Clay clay clo, eu paro de ir
Clay clay clo, eu paro e acordo
Novamente temos um interlúdio no EP, “Circular 3”, que remete a uma linha de ônibus da sua cidade de nascença, Taboão da Serra (mais especificamente da região onde foi criado). Esses pequenos detalhes fazem ainda mais a diferença quando falamos de um trabalho que carrega um peso emocional tão forte. Por fim, temos a faixa “Vividir” que também conta com a participação de Dinho, novamente com um sentimento de alivio. É muito interessante como o beat desse som traz alguns elementos sonoros que ambientam o ouvinte para uma beira de mar, algo que conversa com o intervalo que Rico dá entre o primeiro e segundo verso da música. Outro ponto a ser destacado é a forma que ele pronuncia o título da track em alguns versos, como por exemplo:
E a gente vive de
Partir sem despedir
Entre um Atlântico e outro
Um cântico e outro
Com tanta saudade pra admitir
Partir sem despedir
Pro coração não dividir
Entre um Atlântico e outro
Um cântico e outro
Tanto que a gente vive de…
A faixa encerra muito bem o trabalho com um resultado satisfatório quando olhamos para o todo. Gosto de citar, sempre que possível, o trabalho das capas: nesse é um retrato de Rico em um elevador, o que teve uma ligação muito íntima com a proposta do projeto, a autoria é de Oga Mendonça.
Rico abusa das dualidades nesse EP, trazendo um trabalho muito pessoal e carregado de sentimento. Em entrevista ao portal Oganpazan, Dalasam diz reflete o EP enquanto uma introdução ao seu próximo disco e, levando em consideração o que vimos em “Dolores Dala, o Guardião do Alívio”, podemos esperar um trabalho de altíssimo nível.
Até a próxima galera.