Review: Emicida – AmarElo

Sim, sou eu de novo, o estagiário da Rap Shit. Agora pra escrever sobre o novo álbum do Emicida, AmarElo. De longe o maior nome do rap nacional na década, o homem não precisa de introduções. Quase 5 anos após seu último álbum, “Sobre Quadris, Crianças, Pesadelos e Lições de Casa”, Leandro voltou a trazer um disco de estúdio ao público, seu terceiro (sétimo projeto no total). Em AmarElo, o MC tenta mudar a sua abordagem lírica, saindo de uma posição reativa, que lhe deu notoriedade ao longo desses mais de dez anos, para uma posição mais ativa: ele vai ter a primeira palavra agora. E essa palavra será de paz.

O título do álbum é um jogo de palavras que já indica a direção, a união de ‘Amar’ com o ‘Elo’. Pela primeira vez em larga escala na carreira, o disco tem como conceito Emicida falando com uma postura positiva.

 

 

Em ‘Principia’, faixa de abertura, o rapper valoriza a união e a vida em harmonia. A track é fechada com uma bela poesia, recitado pelo Pastor Henrique Vieira; em ‘Paisagem’ ele fala sobre manter a paz de espírito apesar dos problemas cotidianos; ‘Quem Tem Um Amigo Quem Tudo’ e ‘Pequenas Alegrias Da Vida Adulta’, bom… os títulos são alto explicativos. Todas essas faixas abordam os sentimentos positivos e questões comuns a qualquer pessoa, desde o trânsito até um romance de adolescência, sendo sons que podem tocar todos os tipos de ouvintes.

Apesar disso, o fato de ser um álbum com conceito definido é o que acaba por causar o grande problema dele: o rapper destrói esse conceito na última seção do disco. Se ele tem 7 faixas que seguem a risca a ideia, as últimas 4 soam como se fossem singles, posicionados juntos ao final do álbum apenas pra fazer números; em nada se relacionam com o que veio anteriormente e muito menos entre si. Pior ainda: as melhores faixas estão nessa seção. ‘Ismalia’, que pode facilmente entrar numa lista de melhores músicas da carreira do rapper, é uma prova de que o melhor Emicida vem da posição de indignação contra o stablishment e situações de racismo que vivemos. Tem versos geniais e críticos, o que não aparecera no disco até o momento.

“Um primeiro salário
Duas fardas policiais
Três no banco traseiro
Da cor dos quatro Racionais
Cinco vida interrompida
Moleques de ouro e bronze
Tiros e tiros e tiros
O menino levou 111
Quem disparou usava farda (Ismália)
Quem te acusou nem lá num tava”

A produção da faixa também é muito mais tradicional, com um ótimo refrão e ninguém menos que Fernanda Montenegro recitando a poesia de Alphonsus Guimarães que dá o nome à canção. Ela é seguida por ‘Eminência Parda’, faixa cheia de significado já no título, pois a expressão é dada àqueles que “comandam nos bastidores”, e é uma clássica faixa de ódio de Emicida, com Dona Onete cantando na intro e, na outro, o “Canto II” de Clementina de Jesus, um clássico na cultura afro-brasileira; também conta com boas aparições de Papillon no segundo verso e Jé Santiago no refrão; a última faixa, ‘Libre’, não tem o menor sentido no álbum; uma música que deveria ter ficado apenas como single, que é como ela realmente funciona.

‘AmarElo’, mesmo sendo a faixa que leva o título, não tem a mesma escrita ou produção do resto. Emicida fala, num tom muito mais alto, sobre o sofrimento, dificuldades e superação, como uma mensagem de “ta foda, mas vai melhorar”, enquanto o álbum diz “estamos bem”; o próprio refrão, sampleado de Belchior e excelentemente cantado por Majur, passa essa mensagem. A faixa teria um pouco mais de sentido se posicionada como a intro pro álbum, mas, estar posicionada no fim do mesmo não tem o menor sentido pra progressão deste.

A primeira seção está repleta de bons momentos. Emicida claramente treinou muito e teve uma evolução enorme na sua voz cantada. Em ‘Cananéia, Iguape e Ilha Comprida’ essa habilidade é colocada em evidência, assim como em ‘Pequenas Alegrias Da Vida Adulta’. ‘Paisagem’, por seu instrumental e refrão, poderia facilmente entrar num disco de NxZero ou Fresno (e não falo isso como algo negativo); as produções ao longo do disco foram minuciosamente colocadas. Nave coloca sua mão na maioria das tracks, provando ser um dos caras mais versáteis da cena. Instrumentais mais leves do que nunca carregam a paz transmitidas nas letras desta porção do álbum.

Embora cada faixa individualmente seja muito bem colocada, como um conjunto, soa repetitivo. Todas as da primeira seção seguem a mesma estrutura: instrumentais leves com voz leve nos versos. Embora as participações (mais notoriamente a de Zeca Pagodinho) deem um alívio a isso, no geral fica mais do mesmo.

Não me levem a mal: Emicida está em outro momento da vida e da carreira, e ele pode fazer o tipo de som que quiser. Sendo o principal responsável por colocar o rap novamente em alta no Brasil, está no DNA do rapper ser inventivo, como mostrou nos dois álbuns anteriores. Mas, isso não significa que o melhor dele virá nessas experimentações. Embora tenha pontos bem altos, depois de mais de 4 anos de espera por um projeto de um dos maiores e mais influentes MCs da nossa história, esperava-se muito, e no final das contas AmarElo deixa a desejar.

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