Descobrindo #04

Salve! Estamos de volta com a nossa série descobrindo, aqui pinçamos os novos talentos do rap nacional e colocamos no seu ouvido. Nesta rodada, trazemos quatro excelentes nomes que pintaram no nosso radar, então se liga aí:

FREEDXM – Segundas Impressões (EP)

Direto de Vitória (ES), Freedxm,  uma dupla de um artista só, chega mostrando muita qualidade e representando bem o rap Capixaba. O EP “Segunda Impressão” tem 5 faixas e traz Freedxm no microfone e seu alter ego Skrrrllex na produção, o que não é novidade no Rap, mas continua sendo um jeito estiloso de apresentar duas facetas de um mesmo artista. Para além de sua autocolaboração, o EP conta também com coproduções de Tibery e Artioli, além da participação de Dudu, referência na cena do Espírito Santo, na música “PQP” que fecha o álbum.

Os títulos das cinco faixas, aliás, são abreviações comuns da internet, mas com novos significados de acordo com o rapper como, por exemplo, a faixa “VSF” que significa “Vou Sentir Falta”. Não sei exatamente o que “TNC”, “FDP”, “DSCLP” e a já citada “PQP” significam neste caso, mas a coesão vai além dos nomes e se perpetua pelo trabalho de diversas formas.

A principal delas talvez esteja nos arranjos que variam entre o soturno e o triste, compondo as músicas com os elementos do beat mais secos e marcados– ambos bem característicos do trap. E é justamente na produção que o trabalho se destaca, no cuidado com os detalhes e a progressão musical que mostram que os beats vão além dos loops curtos reproduzidos, ao longo de cada canção, com pequenas mudanças. Aqui o som anda e varia até o fim, mesmo com um clima bem definido, como falado anteriormente.

A entrega do MC também é interessante, chama a atenção a boa pronúncia e o som limpo, mesmo em letras complexas ou com o autotune, mais um ponto para a se destacar na produção de “Segundas Intenções”.

Suas letras são repletas de rimas sequenciais explorando palavras de mesmo radical e as antíteses – técnicas popularizadas no Rap BR por BK’ e Djonga, respectivamente – ambas feitas com eficiência. Mesmo com recursos já conhecidos do público, FREEDXM mostra talento em um trabalho coeso, podendo se arriscar em algo mais pessoal nos próximos trabalhos, se assim desejar.

-Lucão

Ikinya – M.E.T.A (EP)

Cria do RJ, Ikinya, apresenta ao público uma voz potente, boas rimas e suas referências que vão de Alcione a Racionais MCs, em seu EP de estreia, “M.E.T.A.”. Adriele começou a ganhar destaque nas batalhas de rima e no movimento “Sarau” por volta dos 16 anos. Posteriormente iniciou um trabalho de mentoria com o selo VVAR, do MC Marechal, construindo o impulso necessário para dar início a sua carreira artística e começar a postar vídeos (covers e autorais) em suas redes sociais.

Trazendo aos ouvintes referências de funk, R&B e Rap, o EP segue o mesmo caminho de seu primeiro trabalho lançado, o single “Breve”, com o selo Diresponsa – mesmo de seu EP -,  com uma ótima voz, pois a jovem de 22 anos canta e rima muito bem.

Com uma batida de funk bem envolvente, característica do funk carioca, a faixa “Nem Quero Saber” tem a produção de TH e baixo – maravilhoso – de Jarbas. Na primeira track, Ikinya já nos mostra que ela não se importa com quem quer atrasar seus planos porque ela sabe aonde quer chegar e nada vai impedi-la.

Em um dos seus vídeos caseiros, a MC postou uma parte da agora intitulada “Bem Vindo a SP”, e chamou a atenção do próprio Mano Brown, que comentou a publicação. A track, que conta com a participação de Kauan e DJ Fire, com certeza é uma das melhores, pois além das ótimas referências a Racionais Mcs, a artista vivenciou a cidade de São Paulo para realizar o EP e assim construir suas próprias experiências.

“Sem Tempo” apresenta um beat bem marcado, de 420nosbeats, e a energia transformada da artista que fez da dor um motivo para se libertar e ir além do que esperavam. Na mesma pegada, “Corrida” expressa a obstinação de Ikinya em seguir com foco na missão, a artista não tem tempo para indecisão e a meta é ficar milionária.

A carioca finaliza o EP com duas love songs. Com a participação de Rasul, “No Fim da contas” descreve um relacionamento entre duas figuras opostas, “cão e gato, água e pedra” que mesmo com as dificuldades permanecem ligados um ao outro. Já em “Louca”, a fã de Alcione mostra a raiz de Adriele e nos presenteia com um rap com samba, sobre o melhor love song que há: o amor próprio. Com participado de Georgia e produção de DJ Murillo e TH, a música fecha o EP da melhor forma, mostrando Ikinya ou Adriele como a mulher forte que é.

Além do significado explícito, “M.E.T.A.” é sigla para Música, Energia, Trabalho e Ação e o EP é exatamente isso, sobre uma jovem mulher que tem energia de sobra para sair do seu lugar de origem e por meio do trabalho conquistar o mundo com sua música. Para um primeiro trabalho, o saldo é bem positivo, Ikinya consegue mostrar através de suas letras a que veio; alcançar a M. E. T. A.

-Amanda VS

Pedro Simples – CARMIM (álbum)

Diretamente de Santo André (SP), Pedro Simples vai além de seu vulgo, atuando como MC, multi-instrumentista e produtor musical e cultural. Como um grande trabalhador da cultura hip-hop, seu trampo acaba por ser guiado pela responsabilidade social e as visões de sua vivência.

Utilizando sua voz como um instrumento que registra a realidade, Simples opta por produções mais sóbrias e bastante pautadas num boombap clássico, em beats que acompanham fortes linhas de baixo e baterias secas e marcantes, mas que ainda sim recebem influências das estéticas do trap, seja pela utilização de adlibs, um BPM mais acelerado ou um grave mais acentuado.

Em março deste ano lançou seu álbum “CARMIM” e impressiona pela forma com que o MC se sente à vontade nos mais diversos estilos e vertentes. Apesar disso, seu foco é a lírica, nela transmite seus sonhos e dilemas, pautando muito bem os problemas sociais vividos por ele e por quem compartilha de sua realidade como artista e morador da periferia.

Mesmo variando pouco em seus flows, o rapper compensa com entregas bastante sensíveis e que acompanham bem os sentimentos das canções. Fica por destaques as faixas, “Latines Americanes”, “S.A. State of Mind” e “Montanha Sagrada”. Pedro Simples é um belo nome para quem procura pelo bom e velho rap, com aquele ar de underground, mas sem deixar de ser datado e com uma qualidade acima da média.

-Gustavo

Yan Cloud – Pinkboy

Para começar, vamos falar da escolha do nome do álbum: Pink Boy. O título dá indícios de como o artista encara questões contemporâneas, como às relacionadas aos estereótipos de gênero.

Essa opção, nas palavras do artista, vem do desejo – e prática –  de resistência pessoal, pois desde criança enfrentou a proibição de usar rosa, assim como deixar o cabelo crescer, dois elementos tradicionalmente ligados à feminilidade nesta sociedade. E é contra tudo que se espera de um jovem preto que Yan se coloca, construindo suas próprias referências e caminho.

A beleza ganha nesse álbum um outro olhar, é moldada como um fator de empoderamento, de autoestima: “Preto de autoestima alta”. A resistência no modo de assumir e cuidar dos cabelos mereceu uma faixa especial, um tema altamente relevante.  Por exemplo, desde 2017, no Brasil, a busca por cuidados com cabelo crespo cresceu mais de 230% em buscadores como o Google, reafirmando a importância da abordagem de Yan;

Neste projeto o individual deixa evidente o político, pois traz esse movimento de afirmação pessoal, que é do artista, mas também é maior porque dá eco à fala de uma comunidade.

E por falar em comunidade, a afirmação da necessidade da autovalorização racial, por meio do amor afrocentrado é bastante presente em diferentes momentos do álbum, ganhando destaque em “Garota de Salvador” que fará muitas pessoas suspirarem pensando naquela certa @.

A produção musical assinada por Zamba e Faustino merece atenção, já que a musicalidade é sempre um ponto alto. Passeando pelas faixas vamos de Salvador a Ruanda; mesclando diferentes gêneros como rap, trap, funk, o artista marca sua identidade.

A faixa “Bafana” ganhou um clipe para lá de bem construído, sintetizando o conceito do álbum. “Bafana, Bafana, moleque de traço, beleza africana”.

Querida leitora, se você ainda não está convencida, basta ouvir o álbum porque ele fala por si só. Depois me conte o que achou, belê?

-Mirian

Esses nomes estarão na próxima atualização da playlist “Descobrindo” no Spotify. Já estão lá os artistas destacados nas edições 1, 2 e 3 da nossa série, além de outros sons de qualidade que o underground vem produzindo. Fica ligado!

A Inverso é um coletivo dedicado a cultura Hip Hop e o seu lugar para ir além do comum.